Hábito comum das usinas de reciclagem de resíduos da construção no Brasil, prática pode colocar em risco financeiro o negócio e comprometer a imagem do produto
As usinas de reciclagem de RCD nascem, em geral, com uma ideia muito superficial sobre possibilidade de ganho ou lucro na recepção dos resíduos da construção e na venda do agregado reciclado.
Porém a realidade mostra que tanto para a destinação dos resíduos como para a venda de agregado reciclado há um fator cultural e legal que impedem as usinas de reciclagem de RCD de operarem em suas capacidades médias. Isso significa que as dificuldades na recepção dos resíduos se deve a uma cultura de descarte irregular e ausência de regulação por parte da prefeitura na geração, no transporte e na destinação do entulho.
Como uma empresa precisa se manter financeiramente, a primeira opção é tentar reduzir o preço dos produtos e dos serviços, assim, a escolha com o resultado mais certo é a redução do preço da recepção de resíduos, o que surte um efeito a curto/médio prazo.
O Relatório Setorial Abrecon 2022 e 2024 mostra uma realidade curiosa das unidades de reciclagem de RCD. Uma parcela significativa de empresários reduzem o valor de entrada do entulho e reduzem também os critérios para a entrada dos resíduos na usina. O objetivo é fazer caixa e dar tração ao negócio.
O maior obstáculo à cobrança de entulho limpo e sujo é fatalmente a cultura da construção, sobretudo a resistência do setor em separar seus resíduos no canteiro de obras, pois historicamente sempre foi de qualquer jeito. Ainda na cobrança dos resíduos da construção, as usinas de reciclagem de entulho infelizmente dependem de um segmento que atua para proteger o gerador, os transportadores (caçambeiros).

Muito precariamente a usina de reciclagem de RCD consegue uma sobrevida com preços de recepção dos resíduos abaixo do custo, contudo, com o sacrifício de receber mais do que a capacidade do terreno.
Essa decisão implica em reduzir a energia do empreendimento (reduzir a triagem e reciclagem de resíduos) e, se reciclar, ter que escoar o mais rápido possível. Como o negócio foi criado para reciclar e não aterrar, a doação do agregado reciclado passa a ser uma opção para a limpeza da área somado ao esgotamento de espaço.
O cenário ideal é a usina de reciclagem de entulho “pagar as contas” apenas com o valor de recepção de resíduos, de forma a pagar todos os custos envolvidos no processo de reciclagem. A venda do agregado reciclado viria para reduzir o prazo de retorno sobre o investimento e dar competitividade ao empreendimento.
Na média, o empreendedor que entra no segmento de resíduos da construção não adota cautela no projeto e, quase sempre, não investiga o mercado em que vai atuar. Resultado: operação em cidade ou região sem mercado de destinação de RCD ou venda de agregado reciclado.
O desespero aproxima a usina de reciclagem de resíduos da construção a operar com energia mínima, pouco pessoal e nenhuma ação de comunicação, o que acaba restringindo e atrofiando o negócio.
A doação de agregado reciclado vem acompanhado de um diagnóstico tardio sobre a reciclagem de entulho nos estados. A ideia inicial que era a recepção, triagem, reciclagem dos resíduos da construção e venda do agregado reciclado, após alguns meses, passa a ser unicamente um aterro de inertes com britagem do RCD e produção de agregado reciclado ocasional.
Esse cenário é revelador, embora comum, pois denuncia a ausência completa de uma agenda ambiental por parte das cidades e estados e o pouco apoio dos governos no encerramento de lixões e atuação em crimes ambientais relacionados a resíduos sólidos.
Do lado do empresário a questão é a baixa qualidade dos projetos, ingenuidade e ideias atabalhoadas sobre a reciclagem.

Antes de abrir uma usina de reciclagem de resíduos da construção, uma ATT (Área de Transbordo e Triagem) ou um aterro de inertes, o empreendedor deve estudar os fluxos de resíduos, principalmente a destinação do entulho. Em regiões onde há um lixão é praticamente impossível obrigar as construtoras a pagar a destinação dos resíduos sem o apoio das prefeituras.
Na perspectiva do agregado reciclado é imperioso investigar os fornecedores de agregado natural, pois mesmo o agregado reciclado tendo um desempenho superior na pavimentação, muitas vezes, as pedreiras e portos de areia têm preços muitos competitivos. Neste cenário não é possível pensar em competir com o material natural.

A doação do agregado reciclado é o último estágio da falência do negócio, e pior, do comprometimento da imagem do produto na região.
O retorno sobre o investimento de empreendimentos dessa natureza supera os 7 anos, assim, o perfil de empresário profissional deve entender que o lucro é o resultado que consolida uma série de acertos do negócio na fase de planejamento.
Antes de doar agregado reciclado e avacalhar o mercado, prejudicando empreendimentos no futuro, o negócio falhou como ideia



