Apesar da disparidade de preços (materiais naturais acima de R$ 150/m³), o setor de construção civil reluta em adotar o agregado reciclado, expondo a falta de uma agenda legal e sustentável.
O esgotamento de recursos naturais, o intenso trânsito nas capitais e as inúmeras restrições para novas jazidas próximas às grandes cidades estão, previsivelmente, elevando o valor dos agregados naturais.
O crescimento urbano acelerado forçou as cidades a construírem estruturas para atender a demandas cada vez mais complexas e a reduzir o déficit habitacional resultante do aumento exponencial da população. Dados da Anepac (Associação Nacional das Entidades de Produtores de Agregados para Construção) de 2023 mostram que o Brasil consome algo em torno de 640 milhões de toneladas de agregados por ano, tornando a indústria de extração (areia e brita) a maior do segmento de mineração no país.
O aquecimento da economia a partir de 2022 juntamente com o lançamento de projetos de infraestrutura represados após a Pandemia de COVID-19 aumentaram a demanda por agregado natural em pelo menos 20%, consubstanciando naturalmente no aumento do preço do produto.
Dos recursos naturais em processo de esgotamento a areia natural é, talvez, o mineral em situação mais crítica.

Nesses últimos 10 anos houve um crescimento visível das areias industriais oriunda da britagem e moagem de pedra, bem como, de areias de resíduos ou rejeitos de minérios (escória de alto forno), porém ações insuficientes para frear o preço da areia natural.
Dados do relatório “A Extração de Areia Ilegal no Brasil” de autoria de Luiz Fernando Ramadon, policial federal aposentado e especialista em crimes de mineração, mostram que os crimes relacionados a extração clandestina de areia em rios e cavas ultrapassa os R$ 20 bilhões de reais por ano.
A areia clandestina entra na construção civil com preços ligeiramente mais baixos devido a carência de produto legalizado, sem nenhum tipo de barreira por parte das construtoras, da Agência Nacional de Mineração (ANM) nem da receita estadual.
58% da areia natural é clandestina. Estados do Norte e Nordeste chegam a 90% de areia clandestina circulando no mercado, resultando em algo em torno de R$ 370 milhões em impostos sonegados, fora o estrago ambiental.

O reajuste dos preços dos agregados naturais não vem acompanhado de reajuste dos reciclados, inclusive a diferença de preços tem se mostrado cada vez mais distantes, a ponto de em algumas praças o agregado reciclado estar a metade do preço dos naturais.
Dados da Pesquisa Setorial Abrecon 2024 mostram que os estados da região Norte possuem os preços mais elevados para os agregados naturais com significativo reajuste de preço em relação a 2022. O Acre e o Amapá chegam a pagar mais de R$ 250,00 o m³ para a brita natural.
Aqui temos um ponto que deve ser analisado: por que a escassez de agregados naturais estimula o uso de agregado reciclado em poucas regiões?
Mesmo que o agregado reciclado não seja um concorrente direto do natural, a opção sustentável deveria substituir o natural em aplicações menos exigentes e avançar nos segmentos de pavimentação, geotecnia e manutenção. No entanto, essa substituição não ocorre na escala necessária.
Não, o agregado reciclado não compete com o natural, ao contrário, complementa o uso do natural e pode até dar sobrevida às pedreiras e portos de areia.
Há diversos fatores para o baixo nível de substituição do agregado natural pelo agregado reciclado, dentre eles:
- Ausência de política pública de estímulo à reciclagem de entulho;
- Cultura preconceituosa da construção em relação a insumos sustentáveis;
- Baixíssimo nível de controle da areia natural;
- Redução do aparato de licenciamento ambiental;
- Complacência dos estados com crimes relacionados à questão ambiental.
A relação direta entre esgotamento de material natural e oferta de agregado reciclado se dá de forma mais pragmática justamente nas regiões metropolitanas de São Paulo: Baixada Santista, Vale do Paraíba, São Paulo, Jundiaí, Campinas, Sorocaba e Ribeirão Preto.
Embora a exaustão das pedreiras e dos portos de areia seja um fator importante na decisão de um novo empreendimento voltado à reciclagem de RCD, o cálculo de viabilidade econômica e de logística não é o mesmo a depender da região.
Mesmo em São Paulo, com aproximadamente um quarto da população brasileira e a maior densidade populacional, os preços mais altos do agregado reciclado se devem à demanda pujante e a uma logística favorável às usinas de reciclagem de RCD, que, em geral, estão melhor posicionadas do que portos de areia e pedreiras e conseguem otimizar até o transporte, como exemplo, indo com entulho e voltando com agregado reciclado.

E ao contrário do que se imagina, o maior mercado de usinas de reciclagem de RCD do Brasil não tem nenhum apoio do poder público, seja por parte das cidades ou do governo estadual que nunca apresentou um plano para o segmento de resíduos da construção.
Dessa forma, a tendência é que cidades com pouca ou nenhuma política pública voltada a resíduos da construção ofereçam agregado natural a preços mais elevados, mesmo com a produção de agregados naturais comprometida.



