Estados não avançam na gestão estratégica dos resíduos sólidos e apresentam mecanismos de controle sem qualquer critério técnico ou estatístico com visão terceirizada e execução desconfigurada.
Há anos a gente da Abrecon vem pedindo atenção das autoridades a respeito dos inúmeros aterros clandestinos de lixo e entulho que tanto assolam a vida das pessoas e até a dinâmica dos negócios.
A ideia é muito simples e prática. Implantar um sistema de declaração compulsória dos resíduos da construção em caráter gradual com prioridade aos grandes centros alinhando tecnologia, conhecimento e metodologia científica.
Ou seja, rastrear o resíduo a partir da sua geração.
Um plano de resíduos sólidos oferece uma oportunidade única ao prefeito ou ao secretário em construir soluções para a destinação, reciclagem e valorização dos resíduos, mesmo com poucos recursos financeiros.
O órgão público, com noção imprecisa e pouco técnica da questão, aceita gratuitamente auxílio de entidades supostamente especializadas no tema.
O lobby de entidades de resíduos sólidos tem se acentuado nos últimos anos e já abocanhou inúmeros planos estaduais de resíduos sólidos. Esses planos foram feitos a partir de convênios com o Ministério do Meio Ambiente e as Secretarias Estaduais de Meio Ambiente.
A ideia das pessoas leigas sobre um plano é uma noção muito próxima de informações pouco práticas e que ficam apenas no papel.
Jogo é jogo, treino é treino. Já dizia Didi, o Pérola Negra, jogador da seleção de 1958 e 1962.
Esse conceito sobre teoria e prática é jogado numa vala comum, priorizando a experiência, mesmo empírica, e valorizando quem faz, mesmo que sem saber como e por onde. Ou seja, a ideia de um plano rápido, simples e objetivo é “bem vista” por alguns setores que querem uma agenda com previsibilidade, simplicidade e um pouco de coesão.
Pois é. Plano, na linguagem da administração, está abaixo do planejamento e é a organização das informações voltada a aplicação do que foi desenhado no planejamento.
De forma didática: A Política Nacional de Resíduos Sólidos nº 12305/2010 apresenta na seção II uma indicação do que será o plano, especificamente no item atinente aos aterros clandestinos, aqui escrito como “lixões:
V – metas para a eliminação e recuperação de lixões, associadas à inclusão social e à emancipação econômica de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis;
Como visto no parágrafo sobre o Plano Nacional de Resíduos Sólidos da Política Nacional de Resíduos Sólidos nº 12305, espera-se que o Plano apresente informações sobre os lixões e formas de eliminação e recuperação do espaço. Simples. O planejamento é a PNRS 12305 e a execução fica a cargo do Plano.
Mostrei o exemplo do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, conhecido por Planares, que é uma tragédia em si. Mas em nível estadual, a coisa é bem pior.
Os estados não têm nenhuma estratégia para os resíduos, seguem terceirizando suas competências e sequer conseguem identificar os problemas ou as prioridades no setor de resíduos.
Infelizmente estamos num dos piores momentos da história. Um retrocesso no pensamento científico e atraso de no mínimo 10 anos.
Foram 10 anos de progresso e 10 anos de retrocesso.
Na gestão dos resíduos da construção e demolição, tivemos a partir de 2002 a resolução CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) nº 307, depois as normas técnicas concernentes à gestão do RCD e a aplicação do agregado reciclado e, seis anos depois, a Política Nacional de Resíduos Sólidos nº 12305, um marco na gestão dos resíduos com texto sofisticado e com pretensão de ser a maior revolução na reciclagem.
Progresso de 2002 a 2012 e retrocesso de 2012 em diante…
A estrutura das secretarias de estados de meio ambiente são precárias, em geral com gente despreparada para lidar com coisas simples e bem distante da realidade dos resíduos no Brasil.
Isso, no fundo, é um projeto de precarização dos serviços públicos e, como consequência, terceirizar a atividade fim da secretaria ou da autarquia.
Mudar o nome de uma secretaria – de meio ambiente para meio ambiente, infraestrutura e logística, não é mero detalhe. É a mudança de postura. De um negócio sério e comprometido para algo jogado, sem sentido, com gente desqualificada e despreparada para as tarefas mais simples.
No discurso barato e populista, o responsável pela pasta diz ser o responsável pelo “melhor plano de resíduos da história com custo zero para o contribuinte”.
O plano estadual de resíduos sólidos “feito de graça” por uma entidade supostamente interessada no tema “resíduos” deve custar caro à sociedade. Feito por leigos sem embasamento técnico e negando informações atuais sobre resíduos da construção, o mecanismo do plano, importante forma para a definição de objetivos de redução, destinação e reciclagem, entre outros, entra no conceito de vala comum, ou seja, a omissão e negligência do órgão público constrói algo estéril, torto, impraticável e viciado, sem função estratégica e distante do ambiente do aspecto legal e ético.
O plano estadual de resíduos sólidos de São Paulo é a ponta do iceberg da incompetência e desmonte de políticas públicas de preservação voltadas à promoção da destinação correta dos resíduos e da reciclagem como forma de emancipar catadores de recicláveis.
Dos inúmeros absurdos apontados, há o mais perigoso: a delegação da atividade fim do órgão público para iniciativas pouco ou nada transparentes sem a mínima participação da sociedade em acordos espúrios e a margem da lei.
Ainda preocupa ver muita gente “copiar” esse modelo de desenvolvimento de planos estaduais e municipais baseados unicamente na premissa da economia de recursos financeiros.
Não há economia, ao contrário, custa muito mais caro.
Um plano estadual ou municipal de resíduos sólidos mal feito tem impacto direto na realidade dos resíduos no estado com influência para os municípios e até para outros estados, como acontece em São Paulo.
Por fim, um plano é o horizonte para a ação, a perspectiva de execução e renunciar a esta ferramenta é, no fundo, acreditar em tudo ou em nada.