Os cinco maiores erros das usinas de reciclagem de entulho

Usinas de reciclagem de resíduos da construção são empreendimentos complexos com interdependência visceral com políticas e empenho de órgãos públicos para o sucesso do negócio.

Nos cursos de gestão integrada de resíduos da Abrecon nós apresentamos dados sobre as relações de um destinatário (seja usinas de reciclagem de RCD, aterros de inertes ou ATT) com itens que definem se o empreendimento terá ou não sucesso.

O sucesso não depende apenas  do empenho dos sócios ou dos gerentes da usina. Obviamente que ter sócios e colaboradores pró ativos é um ponto positivo, porém, sem legislação que combata o descarte irregular de entulho na região, CTR (Controle de Transporte de Resíduos) eletrônico ou em papel e uma política de incentivo ao consumo do agregado reciclado, nada vale a pena. Definitivamente nada. Não adianta ter compaixão do meio ambiente, sensibilidade quanto a situação da cidade e uma ideia genial se esses pontos não forem atendidos. Infelizmente.

Tudo começa com um arcabouço jurídico, com leis, decretos e normas técnicas específicas para o setor.

É habitual e têm sido recorrente algumas cidades encomendarem soluções para o destino do entulho no município. Bem curioso, porque o entulho está sendo descartado em um determinado terreno ou nas ruas há anos, porém, o prefeito e seus assessores querem a solução em meses, já vi secretários de meio ambiente exigirem de seus subordinados soluções para o entulho em semanas. Loucura. É uma loucura.

Aqui vou relacionar cinco fatores causas de insucesso de usinas de reciclagem de resíduos da construção.

Naturalmente, como eu resolvi resumir em apenas cinco causas, é provável que eu deixe algumas questões de fora, porém, pensei em itens que são mais contundentes, e de  certa forma, podem servir como lição para os entrantes do mercado.

 

Usina muito grande para um mercado pequeno

Ter noção do mercado é extremamente importante na hora de empreender na gestão dos resíduos da construção e demolição. Não adianta montar uma usina que processa um milhão de toneladas por mês sendo que a região gera duas toneladas no mesmo período. Isso é um exemplo grosseiro apenas para mostrar a discrepância de realidade e projeto, pois há no Brasil, incrivelmente, usinas operando com menos da metade da capacidade, simplesmente porque o projeto é superdimensionado. Operar com capacidade ociosa representa custos na operação, assim, é sempre inteligente “pensar” numa estrutura que possa atender e acompanhar a geração de resíduos da cidade, sem viagens utópicas que encarecem o projeto.

O mesmo vale para usinas muito pequenas em mercados mais evoluídos.

Tem usina por aí que é tão pequena que se não vender agregado reciclado ou chover, a empresa para. Não tem espaço para estacionar, não tem espaço para estocar o entulho, muito menos para a triagem dos resíduos e outras operações assessórias. É desanimador. Tudo é motivo para encerrar a operação de recebimento de RCD.

E os problemas decorrentes de uma estrutura pequena resultam numa política muito restritiva de recebimento de resíduos pelo fato de não ter espaço para a triagem e acondicionamento de rejeitos.

Usina sem comunicação e divulgação

Você já comprou um sapato pela internet? Você sabe o que é linfonodos? É certo que na primeira pergunta a sua resposta será sim ou provável. Na segunda pergunta, você deverá buscar o significado de “linfonodo” em seu smartphone conectado a internet, evidentemente.

Essas duas questões são apenas para você entender o que é a internet em nosso negócio e como as pessoas a usam para fazer tudo.

Sim, hoje ainda há empresas que não têm site, muito menos rede social. É triste, mas isso é a realidade de grande parte do mercado de usinas de reciclagem de RCD e quiçá de Aterros de Inertes e Áreas de Transbordo e Triagem – ATT.

No pain, no gain. Sem site, sem negócio, sem ligações e sem projeção.

Ter um site ou uma rede social ainda não garante sucesso no negócio. É necessária uma estratégia de comunicação eficiente, bem como, alimentação diária e contínua nas redes sociais para “aculturar” o mercado do produto, neste caso, o agregado reciclado e o serviço de descarte de entulho.

Usina em cidade sem legislação sobre o tema

Mais comum do que se imagina, o empreendedor não leva em consideração o aspecto político ao empreender. Isso é importante, pois significa que o ente público terá condições de atuar para a fiscalização do descarte irregular de entulho e a consumir o agregado reciclado da usina.

O descarte irregular de entulho disseminado inviabiliza a operação de uma usina de reciclagem de RCD, ATT ou Aterro de Inertes, justamente porque o empreendimento não consegue cobrar o descarte do entulho a um preço que pague sua operação.

Atualmente, o poder público é o maior consumidor de agregados (natural e reciclado) nas cidades, assim, ter uma lei sobre o consumo do reciclado conta ponto no sucesso de um empreendimento que recicla RCD.

Concorrência acirrada em mercado restrito

Se já é difícil operar em um mercado de resíduos da construção civil, imagine ter um concorrente que avilta os preços de recebimento de RCD e prostitui o setor com material contaminado…

O que têm acontecido nos últimos tempos é a concorrência de usinas com usinas, com ATTs, Aterros de Inertes, terraplenagens e até caçambeiros.

Ao invés de se juntarem para promover o negócio e combater o descarte irregular de entulho, algumas usinas preferem assumir uma postura beligerante com seus pares. Isto drena energia da usina e compromete sua eficiência.

Descompromisso com a causa

Se é comum encontrar usinas de reciclagem de entulho sem estratégia de comunicação, digo a você que é mais comum ainda encontrar empreendedor distante do negócio, sem paixão pela causa e desligado do tema.

Entrar no negócio da reciclagem de entulho achando que vai ganhar rios de dinheiro é o passaporte para o fracasso.

Empresário vaidoso e perdido é o que mais se vê nesse mercado.

Qualquer negócio ligado a destinação de resíduos exige acompanhamento perene, justamente pela condição extremamente frágil do negócio.

Gostar ou ter simpatia pela causa ambiental não é suficiente para manter o negócio de pé, infelizmente.

E aí, falei tudo?

Inevitavelmente eu deixei algumas regras de fora, mas quis focar numa lista simples e bem prática.

Eu acredito que muito se avançou na prática da gestão dos resíduos da construção. Não há mais empresas descomprometidas com o negócio como há dez anos, bem como, os investimentos são mais assertivos, talvez, em algum grau, percebendo os erros alheios.

Temos ainda muito a evoluir, mas o que vejo hoje me agrada bastante. É o início de uma nova fase, quem sabe de empreendedores mais conscientes de seu papel. Tomara.

Nos próximos artigos eu vou explorar mais os outros motivos de fracassos das usinas de reciclagem de entulho.

 

Levi Torres

Coordenador da Abrecon e colunista do Portal TEM Sustentável

Sobre o autor
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