Cobrar responsabilidade do gerador do resíduo ou sucumbir à pressão dos clientes e aceitar o prejuízo e à exposição?
O setor de transporte de resíduos da construção, também conhecido por caçambeiros, vive um dilema desde seu início em virtude da escassez de espaço para a destinação de RCD, regulamentação crescente do negócio e pressão do gerador do entulho por preços.
Esse segmento cresceu baseado na ilegalidade, descartando entulho em aterros clandestinos, lagos e lagoas, ruas e rios e até no mar, sem o mínimo de regras e com respaldo da população e do poder público. Embora isso ainda seja a realidade de grande parte do país, a regulamentação do transporte de resíduos avança nas capitais e cidades médias em virtude dos impactos nocivos dos aterros clandestinos ao meio ambiente, aos animais, às águas e à população, que sofre com as queimadas de lixo nos aterros clandestinos em direção às moradias.
É fato que o segmento de caçambas de entulho não avança conforme a necessidade do setor, sobretudo em sofisticar seus procedimentos a níveis mais elevados e atender de forma mais profissional seus clientes.
Itens essenciais como contrato de prestação de serviço, nota fiscal e CTR ou MTR ainda estão distantes da maioria dos empresários caçambeiros.
A caçamba de entulho é imprescindível para a limpeza e organização das cidades, especialmente para os grandes geradores, para as prefeituras e para a construção pesada, porém, sofre um apagamento na legislação e normas atinentes ao negócio em todos os níveis que ainda não é percebida pelos empresários.
Uma consulta simples nos planos estaduais e municipais de resíduos sólidos não se vê um capítulo, uma frase, um gráfico, nada, sobre o segmento de caçambas de RCD e volumosos.
O dilema dos transportadores de resíduos da construção é quase que uma questão de sobrevivência: ou se entregar a ilegalidade mantendo os crimes ambientais colocando em risco a própria existência ou cobrar a responsabilidade do gerador e preservar a lucratividade do negócio.
Esse impasse não é tão fácil de resolver.
Antes de sermos empresários, somos cidadãos. Os crimes ambientais relacionados com os resíduos da construção e demolição que assolam as cidades impactam diretamente a vida de milhares ou milhões de pessoas que não vemos. O lucro das empresas de caçamba não podem vir da desgraça alheia, da penúria ou do empobrecimento da comunidade.
Decerto o lobby pragmático da construção civil construiu uma ideia que todos os problemas na gestão dos resíduos da construção é culpa do transportador. Inúmeras cidades aprovaram regras e leis responsabilizando o transportador pela guarda e destinação dos resíduos, não obstante a resolução do Conselho Nacional de Meio Ambiente – CONAMA nº 307/2002 deixar claro que o gerador é responsável pelo resíduo que gera. A cadeia dos resíduos da construção é injusta com os transportadores e privilegia seus algozes.
Por que as prefeituras aprovam regras cada vez mais rígidas para o estacionamento e manutenção das caçambas sem base informacional nenhuma?
Por que as regras municipais para as caçambas estacionárias não imputam responsabilidade ao gerador do resíduo?
Por que o transportador deve oferecer serviços mais baratos com custos elevados e ainda responder por vandalismos nas caixas estacionárias mesmo o equipamento estando em poder do gerador?
É fato que a prefeitura decide sem conhecer o setor baseado numa ideia precipitada e com forte presença do lobby da construção disposto a afastar toda e qualquer ideia que venha a gerar despesas para as construtoras.
Para piorar o negócio, o segmento das caçambas não possui unidade, sequer uma associação forte e não tem ideia dos reais problemas do mercado de locação de caçambas estacionárias e basculantes.
Uma reunião com empresários transportadores é um samba doido, com vários instrumentos tocando sem sintonia em ritmos diferentes. O empresário não consegue ver além do que enxerga e imputa seus problemas à política pública, a atores distantes do negócio e até aos destinatários de RCD.
Portanto, a emancipação do transporte de resíduos da construção passa pelo enfrentamento do abuso por parte das construtoras, da unidade do setor em torno de pautas urgentes e da renúncia de demandas pontuais e comerciais que congestionam a construção de um bem comum.