Governo precisa levar a sério a gestão do RCD

Até aqui o Estado de São Paulo tem se orientado e acatado sugestões do setor da construção com ideias e ações que não alcançam a sustentabilidade nem aliviam os problemas relacionados ao descarte clandestino e irregular de entulho, questão ainda não reconhecida pelos órgãos públicos.

O Estado de São Paulo tem o maior mercado de usinas de reciclagem de RCD do Brasil e possui o maior número de destinatários de resíduos da construção desde o início da atividade.

Paralelo a isso, também é o estado com o maior número de aterros clandestinos e irregulares do país. Dados da Abrecon até junho de 2023 apontam mais de 100 locais com descarte irregular e clandestino de lixo e entulho com anuência do poder público e, em alguns casos, até licença ambiental concedida pela CETESB.

Isso acontece devido ao adensamento concentrando, bem como, São Paulo representar quase um quarto da população brasileira. O adensamento associado à conurbação e a atividade econômica, a grosso modo, gera sinergia na construção, o que resulta em mais resíduos e, como consequência, mais infrações e crimes ambientais.

A capital do Estado foi a primeira a implantar uma usina de reciclagem de RCD em meados da década de 90. A unidade instalada no bairro de Santo Amaro, zona sul, operou por alguns meses e o equipamento foi vendido, por fim, como sucata.

A ideia de que um britador de entulho vai resolver tudo é a mesma há pelo menos 30 anos. A prefeitura de São Paulo pensou a mesma coisa em 1992 quando instalou um britador de resíduos da construção e não conseguiu operar.

A situação do estado de São Paulo na gestão dos resíduos da construção e demolição é caótica há anos e tende a piorar. As cidades acreditam que um equipamento pode resolver de vez o descarte irregular de entulho, bem como, num toque de mágica, transformar lixo em produto.

Esse conceito equivocado sobre entulho é acentuado pelas políticas de doação de equipamentos fixos e móveis da Secretaria Estadual de Meio Ambiente que, alheia a entender a dinâmica do setor de resíduos da construção, aceita e acata sugestões das construtoras.

Os aterros clandestinos de lixo e entulho vem crescendo ano após anos e tomando proporções gigantes a ponto de o crime organizado se apossar de ações nas regiões metropolitanas lastreadas na ausência e negligência do estado nessa área.

Governo de São Paulo não tem metas para encerrar aterros clandestinos
Aterros clandestinos de lixo e entulho na Região Metropolitana de Campinas (RMC)

Isso vem acontecendo há pelo menos quinze anos e o resultado é trágico.

A partir de 2020 a secretaria estadual lançou o que nós podemos afirmar como sendo o ápice do caos e desorganização: o Plano Estadual de Resíduos Sólidos de São Paulo.

A falta de política pública a médio e longo prazo e a terceirização na construção de metas e objetivos para apontar caminhos para uma gestão mais inteligente e estratégica do RCD produz um fenômeno de enfraquecimento do Estado como órgão de arbítrio e o fortalecimento de lobbies que desejam unicamente  o desmonte de regras e leis que criem responsabilidade para o gerador.

A letargia da secretaria de meio ambiente, enfraquecida ano após ano, atualmente esta pasta é responsável por logística, infraestrutura e meio ambiente, juntamente ao empoderamento da construção em políticas públicas aponta para tempos difíceis.

É certo que o plano de resíduos do Estado de São Paulo é o pior do Brasil. É certo ainda que isso só acontece em virtude do órgão público entregar uma das poucas ferramentas de planejamento à iniciativa privada e confiar a ela a função de “pensar”.

Não é correto nem adequado um plano de resíduos sólidos ser construído por alguém que desconhece o segmento, que não conhece os meandros do setor de destinação de resíduos da construção (ATT, aterro de inertes e usinas de reciclagem de entulho) e sequer tem informação para isso.

Descarte de resíduos da construção em ruas e avenidas
Prefeituras não tem orientação para o monitoramento dos resíduos da construção e demolição

O governo precisa tomar as rédeas da questão e assumir protagonismo no combate ao descarte clandestino e criminoso de lixo e entulho, agenda reconhecida pela governança e diversos organismos internacionais, bem como, pressionar as cidades a resolverem seus problemas concernentes ao RCD.

É inaceitável a secretaria de meio ambiente se orientar numa visão pobre e hermética com dados e informações que desconhece, desenvolvida por um ente externo às demandas da sociedade.

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Mais de 70% do entulho é descartado de forma clandestina