A construção civil gera cerca de 60% do volume de resíduos que vão para os aterros, criando impacto ambiental e ônus aos cofres públicos. Parte desses resíduos é proveniente de descontaminação de solos e, principalmente, de demolições. Em tempos de terra rara e cara nas grandes cidades, a solução da indústria imobiliária tem sido pôr abaixo velhos prédios e casas para dar lugar a novos edifícios. Essa atividade vem merecendo a atenção de algumas empresas demolidoras que, além de retirarem os materiais inertes e reaproveitáveis como esquadrias, louça e metais sanitários, destinam o entulho para reciclagem. Na ponta do processo, este novo nicho de mercado – um aprimoramento do setor de demolição – devolve matéria-prima à indústria da construção civil.
A tendência instigada pela Resolução Conama 307, em vigor desde 2003, e agora fortalecida pelo Plano Nacional de Resíduos Sólidos, levou as construtoras a investir na gestão dos resíduos por elas gerados. “A demolição é uma fatia do mercado que gera resíduo e, graças a essa legislação, as construtoras foram obrigadas a se adequarem, o que puxa toda uma cadeia produtiva junto”, diz Gilberto Meirelles, presidente da Abrecon – Associação Brasileira para Reciclagem de Resíduos da Construção Civil e Demolição.
“Cada construtora tem um plano individual de gerenciamento de resíduos. Ele é obrigatório e segue normas e leis que caracterizam os materiais por classe, ou seja, têm produtos que são recicláveis e outros que são destinados diretamente a aterros. Antes de iniciar a obra, já é descrito quais são os tipos de materiais que serão gerados e o que será feito deles”, explica Meirelles que confirma o surgimento no mercado de novas empresas ou a transformação de demolidoras convencionais em empresas que se dedicam a desconstruir imóveis com critério.
No entanto, a atividade depende muito mais de a construtora ter seu plano de gestão de resíduos do que da própria demolidora. “A demolidora é contratada e deve cumprir rigorosamente o que foi definido pela contratante, além de ser responsável pelo transporte e destinação dos materiais. Porém, a construtora acaba tendo dificuldade na rastreabilidade dos produtos, e a demolidora pode mentir”, alerta. O ideal é buscar no setor empresas com histórico e credibilidade, já que não existe uma padronização de procedimentos nessa atividade.
Situação mais confortável é o das construtoras de empreendimentos desejam as certificações como o AQUA ou o LEED. “Esse é o jeito seguro para o cliente final saber que comprou um imóvel que atende as premissas da sustentabilidade, desde a eventual desconstrução e correta destinação dos resíduos de um edifício pré-existente até os recursos embarcados no novo empreendimento.
O presidente da Abrecon constata que, nos últimos anos, houve uma evolução real das soluções de destinação e reciclagem dos materiais, tanto de demolição como dos canteiros. “Há um novo mercado de fornecimento de insumos resultantes da reciclagem, que chegam a ter preços 30% menores do que um produto original” , diz, destacando outra boa prática: “é possível deslocar um britador móvel para o canteiro que, depois de separar o concreto do entulho, tritura o material. Esse concreto pode ser reutilizado na própria obra como pedra ou areia, dependendo do tipo de equipamento utilizado. Quando a obra não consome todo o material reciclado que gerou, o restante é comercializado”.
Meirelles afirma que é muito comum a não utilização pela obra de tudo o que foi reciclado. Neste caso, desenvolvem-se projetos de logística reversa. “Às vezes, a obra não permite por questões de licenciamento, de espaço ou volume, que seja realizada a reciclagem. Fazemos, então, um acordo com a construtora. Ficamos com o material, britamos em uma área de unidade fixa, e devolvemos no mesmo caminhão em forma de matéria-prima” , relata, comentando que o procedimento foi utilizado por sua empresa num contrato com a Subprefeitura de Jabaquara, em São Paulo.
Já os itens que as empresas de desconstrução retiram intactos de uma edificação são comercializados por lojas especializadas em produtos de demolição. “Esses comerciantes compram os produtos de uma demolidora e os vendem da mesma forma que os materiais de construção em geral. A única diferença é que os produtos vendidos são usados, como madeira e tijolo. É um mercado que existe há alguns anos, mas muitas pessoas desconhecem”, comenta.
A receita das recicladoras vem de duas frentes: quando recebem o resíduo – inclusive a valores inferiores aos pagos pelas construtoras quando utilizam o aterro – e na venda do reciclado. “É vantagem para os dois lados: para quem está gerando e para a recicladora que tem uma receita de entrada – tratar o material – e uma receita de comercialização do produto. Essas duas fontes são necessárias para a conta fechar, senão o empreendimento não para em pé”, garante.
Fundada em janeiro de 2010, a Abrecon tem 21 associados e já mapeou 120 empresas recicladoras em atividade no país. “Acreditamos que tenha mais 300 empresas, mas ainda não conseguimos mapear. No ramo da construção civil, a Abrecon é a única que reúne demolidoras e recicladoras, e tem como objetivo disseminar reciclagem de resíduos no país”, afirma Meirelles.
Redação AECweb | 27 de outubro de 2011